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Análise: Headliner Novinews (Switch) reflete o impacto da mídia na sociedade através do sensacionalismo

No papel de um editor do jornal mais influente da cidade, cabe ao jogador filtrar as notícias para o bem (ou mal) da população.




Headliner Novinews, assim como seu antecessor Headliner, é um jogo indie de aventura desenvolvido pela Unbound Games em que as escolhas do personagem impactam diretamente no decorrer da história. No controle do “Headliner”, o(a) editor(a) do jornal mais importante da cidade, o jogador deve selecionar quais matérias serão publicadas em cada edição.


O fluxo do jogo é dividido em dias que possuem dois momentos. O primeiro é durante o expediente do personagem, no qual as notícias devem ser aprovadas ou rejeitadas após as orientações de seu chefe. Já o segundo ocorre no caminho de volta para casa do(a) editor(a), enquanto é possível perceber as consequências das decisões realizadas anteriormente.

FAKE NEWS?

O jogo se passa na cidade de Novistan, um cenário (não tão) futurista com drones, hologramas e modificações genéticas. Apesar do alto desenvolvimento tecnológico, a cidade lida com problemas como doenças contagiosas, precariedade nos planos de saúde, xenofobia, conspirações e outros conflitos que podem acontecer durante a semana.

As notícias recebidas no início de cada dia representam os aspectos da situação da cidade. Por exemplo, há diversas matérias questionando os efeitos causados pela BetterBuzz, uma bebida que chegou em Novistan para substituir a cerveja tradicional. A reação das pessoas muda de acordo com a maneira que o produto é abordado no jornal, e isso impacta indiretamente em outros setores como a saúde dos cidadãos e a resistência de pequenos comércios.



O interessante é que não há nenhum fact-checking, ou seja, confirmação da veracidade do conteúdo escrito nas matérias. Portanto, as decisões partem fundamentalmente dos valores morais de cada pessoa, o que torna cada escolha ainda mais impactante na sociedade. Em diversos momentos do jogo isso é abordado nas interações entre o Headliner e outros personagens por meio de frases como “Até uma mentira repetida muitas vezes se torna uma verdade”.

Vidas em jogo

Manipular a mídia apenas por selecionar as matérias parece uma ideia facilmente executável em um primeiro instante. Porém, conforme a história avança e as consequências de suas decisões aparecem, o jogador começa a perceber que mesmo as notícias mais simples e objetivas, como reportar a morte de um cidadão local, podem levar a interpretações perigosas.

Outro ponto que torna Headliner Novinews uma experiência única é a maneira como os caminhos tomados na carreira do(a) editor(a) refletem em sua vida pessoal e vice-versa. A melhor representação disso é a relação entre o personagem e seu irmão Justin, que sofre de alguns transtornos mentais e busca iniciar a carreira de humorista. Em determinado momento, ele pede para que o(a) protagonista aceite uma matéria sobre seu primeiro show, mas isso vai totalmente contra o código de conduta do jornal, que não aceita textos de terceiros.



Além de Justin, existem outros NPCs tão carismáticos quanto. Aliás, criar uma atmosfera de empatia por personagens de diversos gêneros, naturalidades, idades, profissões e condições é algo que o jogo sabe fazer muito bem. Em alguns momentos, um breve diálogo com sua parceira de trabalho exige mais cuidado com as palavras do que a seleção de uma notícia de última hora.

Para se ter uma noção melhor de quais matérias selecionar, é interessante explorar a cidade e interagir com o máximo de pessoas possível. Dessa forma, é possível ver a partir de outras perspectivas como cada informação publicada influencia a vida de outros indivíduos. Essa exploração acontece por meio de um side-scrolling em uma área de Novistan, cujas extremidades são a sede do jornal e o prédio onde o(a) editor(a) mora.

Já a customização do(a) protagonista é um pouco limitada, pois há uma pequena quantidade de personagens e roupas para selecionar. Mas apesar de reduzidas, essas opções são bem inclusivas, já que contam com modelos de homens e mulheres de diversas raças, além da possibilidade da não-binariedade, incluindo os termos apropriados.



Os gráficos não são inovadores ou espetaculares, principalmente durante a exploração da cidade, em que várias figuras são reutilizadas e os elementos possuem uma modelagem 3D com pouquíssimos detalhes. Ainda assim, a ambientação do game é muito bem desenvolvida, contribuindo para a imersão do jogador em um cenário, na maioria do tempo, descontente e insatisfeito.

O uso de elementos para representar os problemas da cidade são simples, mas marcantes, como uma pichação ou pessoas doentes. Durante os diálogos, as imagens utilizadas em cada fala ilustram perfeitamente as expressões de cada personagem. Tais aspectos gráficos apenas reforçam o fato de que o jogo foca no desenvolvimento da narrativa, e não em apresentar uma experiência visual extraordinária ou uma jogabilidade inovadora

O destino em suas mãos

Não é difícil prever que, com tanta liberdade de escolhas por parte do jogador, Headliner Novinews possui vários finais. Aliás, são muitas combinações, pois ao mesmo tempo que algumas decisões impactam diretamente o resto da cidade, outras são mais independentes e não influenciam tanto no contexto geral de Novistan.

Isso faz com que o título apresente um fator de rejogabilidade incrível, pois em cada campanha é possível fazer decisões totalmente diferentes, seja para contribuir com causas nobres, apoiar organizações conspiracionistas ou simplesmente transformar as ruas em um ambiente completamente caótico. Além dessa vasta quantidade de escolhas, a disponibilidade de conteúdo desbloqueável após alcançar um final aumenta a diversidade de elementos no jogo.



Por fim, vale mencionar sobre a exploração do recurso de Touch Screen do Nintendo Switch no game. É possível aproveitar o jogo inteiro no modo portátil sem mover um analógico, mas a verdadeira vantagem ocorre durante os momentos de seleção de matérias, em que os controles tradicionais não possuem muita praticidade e a organização das notícias torna-se muito mais simples com toques na tela.

A arte imita a vida

Headliner Novinews é um jogo que oferece horas e horas de gameplay devido à grande quantidade de conteúdo explorável e ao alto fator de rejogabilidade. A semelhança do game com Papers, Please é considerável, sendo uma ótima escolha para admiradores deste último, mas sem toda aquela frenesia que apressava a tomada de decisões. Sem um limite de tempo para lidar com as situações, é possível aproveitar a experiência e refletir a mensagem do jogo - como a mídia influencia (e é influenciada) pela sociedade - com mais calma.



Porém há um problema: o jogo requer um domínio intermediário da língua inglesa, já que é a única disponível e a leitura de textos com um vocabulário mais específico é bastante importante para a compreensão da história. Além disso, o preço na eShop americana (‎US$ 13,99) é bem maior do que na Steam brasileira (R$ 5,00), o que pode afastar possíveis compradores.

Enfim, é um indie muito interessante e que vale a exploração, principalmente ao abordar uma temática que, mesmo contextualizada em um futuro próximo, é bastante atual. Mas cuidado: é bem difícil resistir à tentação de iniciar outra campanha, refazer todos os seus passos de forma diferente e descobrir novos finais.

Prós

  • Jogabilidade simples e fluida;
  • Temática bastante interessante;
  • Grande variedade de conteúdo para explorar e decisões para tomar;
  • Múltiplas combinações de finais;
  • Alto fator de rejogabilidade;
  • Excelente uso da Touch Screen do console.

Contras

  • Precariedade dos gráficos e da customização do(a) protagonista, ainda que inclusiva;
  • Necessidade do domínio da língua inglesa para compreensão de alguns termos.
Headliner Novinews — Nintendo Switch — Nota: 9.0
Análise produzida com cópia digital cedida pela Unbound Games
Revisão: Vinicius Rutes 

Estudante de publicidade que saiu do interior de Goiás para viver na cidade grande. Apaixonado por jogos, musicais e animações, passa bastante tempo no Twitter comentando sobre esses assuntos.
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