Blast from the Past

Muramasa: The Demon Blade mostra que o Wii não deve em nada para a concorrência

O game desenvolvido pela Vanillaware para o console branco da Nintendo é tranquilamente uma das melhores experiências da sétima geração de consoles.


O Wii, por conta do fenômeno que foi em seu auge, recebeu uma quantidade absurda de tralha. No entanto, é notável também que tenha recebido uma série de pérolas muito bem-acabadas, que se mostraram impressionantes para um console de capacidade técnica tão inferior em relação aos seus concorrentes. Um deles é Muramasa: The Demon Blade, que, em uma época quando resgatar a jogabilidade 2D ainda não era tão comum, chegou ao console branco da Nintendo com uma proposta interessante.


O jogo se divide em dois protagonistas, a princesa Momohime e o ninja Kisuke, cada um com suas respectivas linhas de enredo. No caso da garota, ela se encontra possuída por um espírito chamado Jinkuro. Momohme, então, torna-se uma alma sem corpo, que acompanha Jinkuro em sua busca por uma espada capaz de fazê-lo largar sua hospedeira em troca de outro mais poderoso. Kisuke, por sua vez, é um ninja amnésico e que, como todo indivíduo nessa condição, é incapaz de lembrar com precisão do seu passado, mas sabe que recebeu ordens sobre roubar certa espada enquanto foge de outros ninjas em seu encalço.



A história na verdade é bem complicada e mais complexa do que isso, visto que o enredo dos dois personagens se cruza o tempo todo e aos poucos é deixado claro que o background de ambos é mais interligado do que aparenta. O diferencial de Muramasa, no entanto, é como, em vez de delimitar uma narrativa linear cujos dois núcleos se entrecruzariam, aqui é possível escolher individualmente cada uma dessas linhas de personagem e segui-las cada uma no ritmo do jogador.

É interessante como isso foi transposto também para o gameplay. O título conta com um gigantesco mapa geral em duas dimensões que pode ser explorado pelo jogador para conseguir avançar no jogo. Para ambos os personagens, o mapa é exatamente o mesmo, mas com algumas seções exclusivas para cada um, sem falar no sentido. Enquanto Momohime parte do leste para o oeste, Kisuke trilha o caminho inverso, fazendo com que, em diversos momentos, os personagens acabem se cruzando em determinadas localidades, como nas casas de banho.



A jogabilidade segue um estilo mais hack and slash, em que os personagens se movimentam de forma fluida enquanto dilaceram os inimigos. Apesar de terem vacilado e feito os dois personagens serem essencialmente iguais em seus atributos — poderiam ter feito estilos de jogo diferenciados para cada um, por exemplo, no intuito de diversificar o gameplay —, é notável que cada um tem acesso a uma variedade espadas com distintas forças e técnicas que podem ser forjadas em uma árvore de habilidades, caso o jogador preencha os requisitos de nível e materiais para tal. Além de umas terem tamanhos diferentes umas das outras (o que altera a velocidade dos golpes, por exemplo), as katanas têm cada uma sua arte secreta que se manifesta de variadas formas, como invocando esferas elétricas à volta do jogador ou em projéteis de vento que acertam inimigos mais distantes.

Como cada uma dessas armas têm seu poder de ataque, não é incomum que deixemos algumas mais poderosas de lado no intuito de continuar com alguma arte secreta em específico que acabe se mostrando mais prática. É possível equipar até três espadas de uma vez, que podem ser alternadas durante as lutas. Eventualmente, elas podem acabar quebrando se recebem muito dano e, enquanto ela se recupera, o jogador precisa utilizar outra para dar conta do recado. É interessante também que as árvores de habilidade de Momohime e Kisuke também acabam se cruzando, sendo possível liberar algumas espadas especiais que valem para ambos caso alguns pré-requisitos sejam cumpridos.



Visualmente, Muramasa é maravilhoso. Com cenários inspirados na arte japonesa do período feudal de uma maneira mais suave e menos cansativa do que outros jogos que já fizeram o mesmo anteriormente — sim, Okami (Multi), estou falando com você —, é possível se impressionar a cada nova sessão do mapa que é liberada, com cenários diurnos, noturnos; externos, internos; urbanos e rurais; cada um com sua personalidade. Os chefões e outros personagens espalhados pelo mundo também exalam vida da forma como se movimentam.

O estúdio Vanillaware fez um trabalho muito bem feito nesse aspecto gráfico, considerando que, num contexto da história dos games em que se buscava ultrarrealismo 3D, sabiam que seria bem mais difícil impressionar com um visual chapado em 2D. Não é incomum nos encontrarmos contemplando os cenários e os sprites dos personagens em vez de progredir na história. É só uma pena que, como o Wii tinha alguns problemas com a questão da alta definição, em algumas reproduções do jogo ele acabe ficando com uma aparência meio embaçada por conta do upscale forçado.



Apesar de tudo, é notável que Muramasa ainda tem alguns problemas. Um deles é justamente o fato de a história, em determinados momentos, simplesmente se tornar um emaranhado tão confuso que o jogador vai simplesmente avançá-la sem entender absolutamente nada. Embora seu entendimento não seja nem um pouco necessário para se divertir com o jogo em si, isso ainda acaba incomodando um pouco algo que poderia ser ainda melhor. Além disso, na reta final, os combates acabam ficando um pouco cansativos por se tornarem repetitivos. No entanto, nenhum desses empecilhos acabam por minar a experiência proporcionada pelo título da Vanillaware. 

Em tempo, é válido lembrar que o jogo ainda recebeu um port para PlayStation Vita. Intitulado de Muramasa Rebirth, além de seguir as histórias de Kisuke e Momohime, outras quatro histórias bem mais curtas foram incorporadas ao jogo por DLC, cada uma com seu personagem próprio. Tal versão chegou às lojas em 2013, quatro anos depois de sua contraparte original.

O Wii, apesar do sucesso, acabou ficando muito estigmatizado na comunidade gamer como um aparelho atolado de títulos de apelo infantil e nada que possa ser considerado hardcore, por mais que tal conceito seja algo completamente relativo e que tal classificação não faça um pingo de sentido. Os verdadeiros entendidos sabem, no entanto, que há uma série de jogos fantásticos para o aparelho e que não devem em absolutamente nada em relação aos títulos dessas tais super-máquinas da concorrência, sendo Muramasa: The Demon Blade um dos maiores representantes desse pensamento. 

Revisão: Bruno Alves

É jornalista formado pelo Mackenzie e pós-graduado em teoria da comunicação (como se isso significasse alguma coisa) pela Cásper Líbero. Tem um blog particular onde escreve um monte de groselha e também é autor de Comunicação Eletrônica, (mais um) livro que aborda história dos games, mas sob a perspectiva da cultura e da comunicação.
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